sexta-feira, 20 de maio de 2011

Dúvidas de uma criança inocente

Filho: - Papai, o professor de Geografia disse que o trânsito de São Paulo também é conseqüência da precariedade do transporte público, verdade?
Pai: - Sem dúvidas. Não haveria tantos carros nas ruas se o transporte público fosse eficiente. Além disso, poluir-se-ia muito menos.
Filho: - Ele disse, também, que iam construir uma estação de metrô aqui do lado, na Avenida Angélica, mas os moradores não deixaram, por quê?
Pai: - Particularmente, aqui em Higienópolis, não há necessidade de uma estação de metrô.
Filho: - Não facilitaria o fluxo de carros?
Pai: - Sim, mas também aumentaria a quantidade de pessoas estranhas no bairro, além das ocorrências indesejáveis e dos camelódromos.
Filho: - Quem são as pessoas estranhas?
Pai: - As pessoas dos outros bairros.
Filho: - É por isso que os moradores do bairro da titia não me deixam jogar bola quando a visitamos?
Pai: - Claro que não, filho.
Filho: - A titia é estranha?
Pai: - Óbvio que não.
Filho: - E por que as pessoas que moram em outros bairros são estranhas, com exceção da titia?
Pai: - É uma longa história... Esquece isso, não me expressei muito bem.
Filho: - Conta pra mim, papai.
Pai: - Agora não dá, estou indo para a Sinagoga.
Filho: - Ok, mas antes de o senhor ir, me promete uma coisa?
Pai: - Diga meu filho.
Filho: - Um dia o senhor me leva para andar de metrô?
Pai: - Sim, um dia.


Texto do Blog.

quinta-feira, 19 de maio de 2011

O medo do Diabo

Durante um vôo para as ilhas Cayman (um arquipélago paradisíaco), abordo do seu jatinho mais luxuoso, Bigode apreciava as fortes palavras de Nicolau Maquiavel, ao passo que Laranja, seu amigo de negócios, tirava um cochilo. A viagem parecia tranqüila, até uma forte turbulência tomar conta da aeronave. Eis que o Diabo aparece e logo se apresenta:
- Sou o Diabo, o dono do inferno. Vim das cinzas para derrubar o avião e matar todos vocês!
Enfurecido, Bigode fechou “O Príncipe”, levantou-se lentamente e caminhou em direção ao anjo decaído, dando início ao melhor diálogo de todos os tempos:
Bigode: - Sei exatamente quem você é. E você, sabe quem eu sou?
Diabo: - Sim, você é o Bigode.
Bigode: - Bigode é o meu nome, sou o dono do Baronil.
Diabo: - Dono do Baronil, desde quando um país tem dono?
Bigode: - Pode não ter um dono na teoria, mas tem um dono na prática.
Diabo: - Como assim, você bebeu?
Bigode: - Só bebo as águas da fonte do Ribeirão, do rio Amapá Grande e do lago Paranoá. Bebida alcoólica, raramente.
Diabo: - Então porque te auto-intitulas “dono do Baronil”? Explique-se logo senão queimar-te-ei ao poucos para que sofras antes de morrer.
Bigode: - Os amigos que fiz durante a ditadura, além da minha forte influência na esfera macumbeira, ajudaram-me a chegar, sem grandes dificuldades, à presidência desse país. Desde então, perpetuo no poder.
Diabo: - Bigode, nem todos que moram no inferno são desatualizados. Sou assinante da revista “Olhe” e sei muito bem que você não perpetua no poder, até porque quem manda no Baronil não tem testículos. Você quer enganar o Diabo?
Bigode: - Independente de ter testículos ou não, sem a minha ajuda, ela não chegaria aonde chegou. Da mesma forma que seu antecessor (que tem testículos e não tem dedo), também não.
Diabo: Ummm... Entendi, só por isso?
Bigode: - Claro que não. Controlo os governadores de vários Estados do Baronil, como se fossem marionetes. Diabo, a revista que você lê não mostra tudo. Para você ter idéia, nomeei Bigodinha como governadora de um Estado logo após sua derrota nas urnas.
Diabo: - Sua filha?
Bigode: - Exatamente. Acertou uma hein, Diabo?
Diabo: - Há-há-há! Você não teme nem a mim, não é?
Bigode: - Claro que não. Tenho amigos supremos, tão fortes que usam capas pretas semelhantes à do Batman.
Diabo: - Nossa! Sério? Conte-me mais.
Bigode: Sente-se, fique à vontade. Aceita um chá?
Diabo: - Só se for de cogumelo.
Bigode: - De cogumelo não tem, um café?
Diabo: - Estou bem assim.
Diabo: - Bigode, pelo visto, tenho muito que aprender com você.
Bigode: - Prefiro que me chame de presidente.
Diabo: - Desculpa presidente. É que estou ansioso. O que mais vossa excelência pode fazer?
Bigode: - Posso fazer no Baronil tudo o que Deus pode fazer no céu.
Diabo: - Deus? Não me fale desse cara, presidente, por favor.
Bigode: - Ok.
Diabo: - Estamos quase chegando às ilhas Cayman, antes do avião pousar terei que retornar ao inferno. Conte-me um pouco mais, dê-me algumas dicas de suas malandragens, ensina-me a ser um Marlon Brando da Sicília.
Bigode: - Bem, estou na politicagem há anos. Conheço os podres de muita gente importante e sei usá-los muito bem. Tenho uma fortuna inimaginável, mas para que não desconfiem, costumo passar parte dela para o nome de terceiros. Para você ter uma idéia, Laranja, esse indivíduo que está ressonando à sua frente, é dono de várias coisas que, na verdade, são minhas, entende?
Diabo: - Sim, claro. O que mais Vossa Excelência tem?
Bigode: - Uma ilha inteira só para mim, alguns bancos, universidades, ministérios...
Diabo: - Sério?
Bigode: - Não tenho porque mentir, nem título de eleitor você tem.
Diabo: - E se tivesse?
Bigode: - Passar-me-ia por santo, indubitavelmente.
Diabo: - Santo? Assim vossa excelência não ganharia meu voto.
Bigode: - Interessante, não tinha pensado nisso. Com exceção de alguns bajuladores, você seria o único a votar em mim pelo que sou.
Diabo: - Realmente...
Bigode: - Aqui vai um conselho, meu caro, quem se importa com os outros não chega a lugar nenhum. Por mais que você odeie as pessoas, mostre o contrário, sobretudo às vésperas das eleições. Além disso, o principal, nunca perca o foco.
Diabo: - Que foco?
Bigode: - O dinheiro e o poder. Almeje sempre isso.
Diabo: - Vossa excelência seria capaz de fazer tudo para não perder o foco?
Bigode: - Claro. Faço isso há mais de quarenta anos e continuarei fazendo até os últimos dias da minha vida.
Diabo: - Então ainda o fará por muitos e muitos anos, pode ter certeza.
Bigode: - Infelizmente não. Estou ficando velho, minha vida está chegando ao fim.
Diabo: - Vira essa boca pra lá, pelo amor de Deus!
Bigode: - Deus?
Diabo: - Sim. Vossa Excelência é uma ótima pessoa, irá para o céu. Deus precisa de Vossa Excelência, amém!
Bigode: - O que está acontecendo, Diabo? Pensei que fôssemos amigos. Você não me quer no inferno?
Diabo: - Não é isso presidente, juro que não é isso.
Bigode: - Você não ouviu direito tudo que falei até aqui, como ousas falar em céu?
Diabo: - Desculpa presidente, preciso ir. Foi um prazer falar com Vossa Excelência.
O Diabo desapareceu em um piscar de olhos, mas antes, sussurrou baixinho para sis mesmo:
- Tô ferrado! Quando esse velho morrer, perderei o emprego.

Texto do Blog.